A dimensão social dos ODS

O terceiro debate do projeto ambiental Diálogos do Pontal – Agenda para o Desenvolvimento Sustentável, ocorreu no dia 15 de maio de 2024, reunindo especialistas que discutiram as principais questões da região relacionadas a clima, especificamente os ODS mais ligados aos temas sociais. São eles: ODS 1 (Erradicação da Pobreza), ODS 2 (Fome Zero), ODS 3 (Boa Saúde e Bem-Estar), ODS 4 (Educação de Qualidade), ODS 5 (Igualdade de Gênero), ODS 7 (Energia Acessível e Limpa), ODS 11 (Cidades e Comunidades Sustentáveis), ODS 16 (Paz, Justiça e Instituições Fortes). Todos alinhados com as carências mais profundas da região.

Saúde pública é um tema sensível no Pontal

O tema saúde pública abriu as discussões, com uma defesa do SUS como o melhor sistema de saúde do mundo. O médico Breno Luis Erbella Casari, secretário de Saúde de Presidente Prudente, fez a sustentação desta afirmação com a experiência de já ter visitado diversos países e conhecido seus sistemas de atendimento à população.

“Hoje nós enfrentamos, além dessas questões envolvendo diretamente a saúde mental, um desafio muito grande em relação à vacinação. A gente tinha uma média de cobertura vacinal do Programa Nacional de Imunização (PNI) em torno de 90%. No dia de hoje, em relação à vacina da gripe no período pós-pandemia, somente em torno de 32% da população está vacinada com mais de um mês e meio de campanha”, relatou sua preocupação.

O mesmo problema está ocorrendo em outras regiões com situações totalmente distintas em relação à qualidade de vida e condições socioeconômicas e culturais. O motivo, segundo o médico, foi “uma globalização negativa dos discursos antivacinas”.

Para ser revertido esse quadro, será necessário um grande esforço. A implementação do modelo que o Ministério da Saúde defende, a estratégia de saúde da família, serve para ter uma cobertura maior da população. “Nós temos um dos melhores índices de casos de dengue do Brasil por número de habitantes: são apenas 192 casos no município de Presidente Prudente, que tem em torno de 230 mil habitantes. Aprendemos com os erros e tentamos ao longo desse ano fazer um trabalho de excelência”, reforçou Breno Casari.

A infraestrutura de saúde nos assentamentos rurais

O médico Mateus Godoy, diretor de Saúde no Campo do Itesp, mostrou que a parceria com as prefeituras tem promovido a inclusão social da população do campo, onde existem inúmeras dificuldades de acesso, locomoção e o próprio povo, por falta de conhecimento, não busca fazer uma prevenção adequada para cuidar da saúde.

“A minha função é criar uma estrutura, estamos ainda na embriogênese do projeto, mas basicamente vamos desenvolver uma estrutura e levá-la até esses assentamentos para fazer cadastramento, visitas, prevenção, consulta, e incluir essas pessoas em uma saúde pública de qualidade em parceria com os municípios”, explicou.

Na região, só de assentados pela Fundação Itesp, são quase cinco mil famílias, e a instituição ainda presta atendimentos a pelo menos mais 1,5 mil famílias que foram assentadas pelo Incra.

Integração dos municípios para o desenvolvimento dos ODS

Fundamental para a consolidação de projetos, a Unesp tem colocado a sua expertise no sentido de apoiar o trabalho desenvolvido nos municípios, falando da Agenda 2030 e dos ODS.

Segundo Raul Borges Guimarães, pró-reitor de Extensão Universitária e Cultura da Unesp, a pandemia da Covid-19 fez o Brasil retroceder em várias pautas em que vinha avançando, como a cobertura vacinal. “Eu sou um geógrafo, mas que estuda a saúde. Eu sou um geógrafo da saúde no departamento de Geografia de Presidente Prudente. Nós estudamos a leishmaniose, a dengue e temos vários temas que tratamos na região. Como pró-reitor de Extensão da Unesp, o que eu tenho para apresentar aqui é uma proposta que estamos implementando de formação de uma rede de cidades”, destacou.

O projeto da entidade, denominado Unesp Cidades, propõe convidar os municípios da região do Pontal para que façam parte da rede para operacionalizar esses ODS. O que é possível se houver união.

Muitas das soluções serão viáveis somente com a integração de serviços públicos entre vários municípios. Um exemplo disso é a gestão de resíduos. Municípios pequenos não conseguem fazer sozinhos essa gestão na área de saúde, sendo preciso que os municípios mais bem equipados e bem aparelhados sirvam como suporte para municípios menores, principalmente em procedimentos de alta complexidade.

Essa é uma realidade que deve ser levada em conta quando se fala de gestão pública e não apenas da gestão municipal. Mas da gestão de um território mais amplo, que tenha identidades e a capacidade de estruturar-se de uma forma mais complexa.

“Entendemos que a universidade é uma plataforma que conecta o local com o mundo inteiro. A universidade tem que ser organizada para atender à demanda regional, mas tem que estar preocupada com os temas que estão colocados no mundo inteiro”, observou Raul Guimarães. “Nós temos na Unesp, atualmente, reunindo os cursos de agronomia e engenharia agronômica, a maior escola de estudos agrários da América Latina”.

Atenção primária aos direitos de saúde da mulher

Quanto à saúde e à condição da mulher nos assentamentos, outro ponto de destaque nos ODS, Jefferson Alexandre, supervisor do Grupo de Agronegócio do Itesp, explicou que “foram mudados todas as normativas; em muitas delas, agora a gente coloca a mulher como a primeira titular da propriedade; isso foi um avanço muito grande que a gente conseguiu, fazendo com que essas produtoras hoje sejam de fato primeiras titulares da propriedade”.

O Itesp tem um grupo que trata da família na gerência de desenvolvimento humano. Sempre há intervenções com essas famílias no sentido de orientar, de mostrar meios, caminhos e formas que possam cada vez mais melhorar essa condição da mulher.

A entidade fez uma cartilha sobre violência contra as mulheres e enviou para todos os assentamentos e todas as comunidades quilombolas. O trabalho foi realizado em parceria com o Ministério Público do Estado de São Paulo, porque no campo é muito mais difícil ser ouvido, falar com as mulheres, com a família como um todo, e nem sempre se consegue fazer as vozes chegarem a quem de fato necessita, explicou Jefferson Alexandre.

“Recentemente, estabelecemos uma parceria com a Secretaria Estadual de Desenvolvimento Social, exatamente para fortalecer a questão do programa Viva Leite. No campo não está chegando esse programa e muitas mulheres não conseguem receber esse benefício. Vamos, portanto, buscar promover o fortalecimento dessas famílias, levar a informação, levar a orientação, mesmo que ainda exista resistência, principalmente do produtor rural e da população um pouco mais envelhecida, que tem resistência em ouvir um fato novo”, pontuou.

Impacto global da integração das mulheres na economia

Um dado levantado pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) diz o seguinte: “Completar a inclusão das mulheres na economia e no mercado de trabalho tem um impacto na economia global igual ao de uma outra China”.

O questionamento que se faz é: quais são os reais impedimentos para que se tenha um avanço mais efetivo e mais rápido nessa questão da real inclusão das mulheres no mundo empresarial, político, executivo e tudo que envolve a atividade econômica e política?

As psicólogas Cristiane Madeira e Rosangela Zamineli, que atuam na Motiva Psicologia Aplicada, buscam lançar luz sobre o tema. “O que me vem à cabeça é pensar que a violência é um dos grandes obstáculos, seja para ela estar dentro do contexto político, seja para ela estar dentro de um contexto econômico ou para ela decidir sua própria vida. Historicamente, ser mulher já é uma violência, uma violência no sentido subjetivo, porque já está pré-definido como essa mulher precisa ser ou o que essa mulher tem que fazer. E quebrar esse padrão é quebrar esse modelo determinado historicamente pela sociedade, pela civilização”, destacaram.

Para elas, o que assusta e preocupa o homem é essa mulher que avança socialmente, que tem um conhecimento político, técnico. “Talvez o grande nó para poder avançar seja a violência, não só física, não só verbal, mas uma violência que já está institucionalizada, de impor qual é o lugar da mulher. Custa para alguns homens aceitarem essa autoridade feminina. Acredito que as mulheres não suportam fazer esse enfrentamento todo dia, toda hora, então é muita demanda psíquica para entrar nesse universo”, apontaram.

As psicólogas, questionadas se a maternidade ainda atrapalha, dizem que para a mulher isso é um outro desafio, porque ela enfrenta uma tripla jornada.

“Como Freud falou: ‘a mãe é culpada de tudo’. Porém, também há uma posição diferente de alguns homens. A Cristiane tocou nessa questão do laço social, em que essa mudança do lado social provocou essa horizontalidade, e a gente tem visto homens assumirem algumas funções que antes eram só das mulheres. Eu penso que estamos no movimento de transição, mas ainda tem muita resistência. Esse papel muito desenhado da figura masculina ainda é um desafio para as mulheres”, pontuou Rosangela Zamineli.

A sociedade ainda tem conceitos muito cristalizados que para quebrar levará muito tempo, mas a maternidade é um desafio que as mulheres estão enfrentando.

As profissionais, que desenvolvem a psicologia clínica, pensam que podia ser incluído um outro critério, talvez para os homens, que elas consideram ser muito importante: o de apreciar a qualidade da sensibilidade. A sensibilidade é uma característica da mulher que os homens precisam desenvolver, porque, talvez, para se sustentar nesse mundo hoje tão plural, essa seja uma aptidão importante.

A geração que nasceu a partir do final dos anos 1990 e início dos anos 2000 está aprendendo a se relacionar de outra forma com as diferenças. É uma geração que tem problemas em relação às coisas práticas do mundo, mas há uma relação mais igualitária entre meninos e meninas, entre homens e mulheres, porque existe a tecnologia que faz a mediação entre eles, observou Dal Marcondes.

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